Giovanni
Semeria nasce em 26 de setembro de 1867 em Coldirodi, lugar próximo a San Remo
(Gênova) e morre em Brescia no dia 15 de março de 1931. Seu pai morre antes do
nascimento do menino, já que contrai a cólera em consequência da luta pela
independência, por isso dirá sempre que também ele foi um órfão da guerra.
Realiza
os primeiros estudos em Turim onde conhecerá a dom Bosco. Aos nove anos
ingressa em um colégio dos jesuítas em Cremona onde conhece aos padres
barnabitas e aos dezesseis anos começa o noviciado. Depois da profissão
religiosa, os superiores o enviam a Roma para que realize os estudos de
filosofia e teologia em preparação ao sacerdócio.
A
correspondência que mantinha com sua mãe era muito frequente; dela se extraem
abundantes observações que nos permitem conhecer a personalidade de Giovanni
Semeria. Durante sua permanência em Roma para realizar seus estudos, dava
também catequese na igreja de San Carlo ai Catinari e naquelas primeiras
atividades de apostolado já manifesta sua predileção pelos pobres, como contara
à sua mãe: “Este ano (1885) o Senhor me
permitiu o contato com os jovens.” [...] “Cada domingo dou catequese na
paróquia, mas pobre de mim, são poucos! São pobres filhos do povo e gosto muito
disso: encontro mais agrado e consolo em tratar com os pobres do que com os
filhos dos senhores: também eu fui e sou pobre.”
Também
pregava no bairro mais humilde de Roma, chamado de Verano, onde conheceu de
perto a miséria tanto moral quanto material daquelas pessoas. Aqueles pobres
foram sua preocupação e não teve paz até conseguir que um grupo de pessoas
voluntárias se apresentassem para ajudar àquela população abandonada. Em 1887
faz a Profissão Solene e três anos depois é ordenado sacerdote sem haver
cumprido ainda os vinte e três anos.
O
apostolado em Gênova
Terminada
sua licenciatura em Letras na Universidade de la Sapienza, se licenciará também em Filosofia, trabalhando no
Instituto Vittorino de Feltre durante doze anos; também foi diretor do Círculo
de Santo Alexandre Sauli fundado pelo barnabita Pe. Francisco Parisi para a
juventude estudantil de Gênova.
Em
Gênova, junto ao Pe. Ghignoni, fundou a Escola Superior de Religião no ano de
1897. As aulas eram frequentadas por diversos profissionais, homens de cultura
e estudantes universitários atraídos pelos argumentos que ali se tratavam e
pela fama do Pe. Semeria. Acorriam protestantes, livres pensadores e judeus. O
que será um dos temas principais do Concílio Vaticano II sessenta anos depois
“um só rebanho e um só pastor” já representava para o Pe. Semeria uma meta
desejada, um ideal a ser alcançado. Ele tratava de convencer aos irmãos
separados com a potência da engenhosidade, com a caridade sacerdotal, com a firmeza
da fé. Nele se desenrolavam paralelamente a atividade intelectual e a ação
benéfica. Deu vida, inspiração e ajuda a entidades caritativas especialmente em
favor dos mais pequenos. Recordemos A
união para o Bem, o Socorro dos Meninos,
o Albergue para os Pequenos, as Colonias de mar e de montanha, as obras
a favor dos órfãos e dos cegos, a Escola
Materna, a Salus Infirmorum.
O
interesse pela questão social esteve sempre presente no Pe. Semeria
Nas
férias de verão, se dirigia ao exterior, com frequência à Suíça, para assistir
às numerosas colônias de italianos que lá residiam por motivos de trabalho.
Também efetuou uma viagem a Rússia em 1903, com intenção de conhecer a Sibéria,
para estudar as condições sociais da população, mas principalmente para visitar
os operários italianos que trabalhavam na construção do trem transiberiano. Lá
teve a ocasião de conhecer a um dos grandes escritores russos do momento, Leon
Tolstoi.
Os
mais rígidos defensores da doutrina tradicional da Igreja quiseram descobrir em
algumas de suas páginas tendência não ortodoxas. Certamente houve muita
incompreensão nas raízes de tais acontecimentos e também má-fé. O Pe. Semeria
não quis entrar em discussão com seus acusadores; portanto não houve polêmica
já que, para discutir tem que haver ao menos duas partes. Se limitou a escrever
e publicar uma breve defesa para quem tivesse interesse em conhecê-la. Não
obstante, apesar de ser o pregador mais procurado e escutado, o proibiram de ir
aos púlpitos das maiores igrejas, e ele obedeceu. O suspenderam de toda
atividade catequética e de magistério, e ele obedeceu. Enfim, o mandaram, “como
medida de precaução”, para longe da pátria e, com o coração destroçado,
humildemente obedeceu.
O Pe.
Semeria sempre foi fiel aos seus ideais
Os
ideais do Pe. Semeria, que são os mesmos pelos quais sempre combateu
valorosamente, estão claros: desejos de harmonia entre vida política e
religiosa; desejos de maior cultura na formação do clero, tachado claramente de
ignorância; desejos de harmonia entre ciência e fé, entre Igreja e Pátria;
desejos de paz.
Pe.
Semeria teve que abandonar a Itália e dirigir-se à Bélgica como os superiores
haviam ordenado. No dia de sua partida ele apenas pôde levar alguns livros: uma
Bíblia, a Imitação de Cristo, a Divina Comédia, I Promessi Spossi. Beijava aqueles queridos livros ao mesmo tempo
que murmurava com o rosto em pranto: “Não, minha santa e querida Igreja não me
abandonará! Me sinto perdido... com estes livros levo um pouco de minha querida
Itália”. Mais tarde se aproximou da colônia de imigrantes italianos em Bruxelas
para prestar-lhes ajuda. Assim se organizou uma vida semelhante à de Gênova,
mas só aparentemente já que persistia nele a grande pena de haver sido
distanciado da Itália.
Na
primavera de 1913 fez uma viagem à Terra Santa. Em Jerusalém visitou a Escola
Bíblica do Padre Lagrange. Quando voltou à Bélgica retomou sua vida tendo
sempre no coração a saudade de seu país. Em maio de 1915, a Itália entrou em
guerra contra os chamados Impérios Centrais (alemão e austro-húngaro). Os
sacerdotes pediram para serem capelães militares no exército italiano. A todos
impulsionava o amor à pátria e o zelo sacerdotal. Pe. Semeria tinha uma razão a
mais: o desejo de poder retornar finalmente à Itália.
A
guerra situou o Pe. Semeria, em primeiro plano, na vida nacional. Chegou ao
Comando Supremo o mais depressa que pôde, apressado pela alegria de voltar a
pôr os pés em sua terra, mas ao mesmo tempo triste já que acudia à sua pátria
como um filho que chega à cabeceira de sua mãe enferma.
Foram
três anos de intensa atividade repletos de episódios edificantes, curiosos,
heroicos que contribuíram para fixar em seu lugar justo o sacerdote, o soldado
e o patriota. Durante a guerra, o Pe. Semeria se encontrou com sua alma gêmea,
o “irmão siamês”, como ele o chamava brincando: Pe. Giovanni Minozzi, com o
qual fundaria a Obra Nacional para o Sul
da Itália, em favor dos órfãos da guerra. Corria o início de 1919. Era
também o princípio de uma obra que levaria o selo de duas vidas imoladas pela
caridade. Os dois Giovanni estavam ansiosos para atuar, mas para levar a cabo a
obra eram necessários liberdade e dinheiro. A liberdade chegou com a
desmobilização do Estado em meados daquele ano. Tanto os superiores
eclesiásticos como o Padre Geral dos Barnabitas consentiram a um sacerdote
secular e a um religioso regular, um laço de união que teve sua justificação na
tenaz resistência e na sua boa fecundidade.
Durante
doze anos Pe. Semeria esteve em contínuo movimento; seus itinerários pela
Itália formariam uma teia de aranha, cada vez mais extensa com o passar dos
anos, até cobrir e abranger toda a península itálica e proximidades. Nunca teve
uma casa. Quando não estava no trem, passava as noites e as poucas horas de
repouso onde se encontrava, nos institutos da Obra, nas casas dos padres
barnabitas ou de qualquer amigo. Costumava frequentar Milão, entre as tantas
casas que se abriam a ele amistosamente estava a casa Montini. Padre Giovanni
Battista Montini, depois Papa Paulo VI, recordava com simpatia o desgrenhado
peregrino que buscava um pouco de repouso em sua casa.
Março
de 1931
Pe.
Semeria pressentia que chegava seu fim. Prova disso foi a carta que escreveu
onde recomendava que cuidassem de seus jovens e de seus educadores. É tudo um
canto de luz e de bondade, de amor e de fé, o sonho de um coração que pressagia
o entardecer de sua vida.
No
dia seis de março chegou de Gênova em Roma. Tinha em mente ir a Montecassino,
San Severo de Puglia, Pádua... Chegou muito cansado. O mal se fazia presente em
seu forte organismo. Depois de uma noite atormentada, um amigo o levou em seu
carro a Sparanise para saudar os órfãos do Instituto. Quando chegou, a febre
era altíssima. Não conseguia se manter em pé. Disse às freiras: Estou um pouco
cansado, tragam-me uma tigela de sopa enquanto repouso um pouco. As freiras,
alarmadas, chamaram o médico. Também chamaram o Pe. Minozzi que chegou no dia
seguinte. Pe. Semeria lhe disse: “Me encontro muito bem. Amanhã tenho que
chegar a San Severo. Não há tempo a perder. Prepare tudo”.
Mas
a realidade era outra, bem diferente. Já não podia se mover da cama. Chamou Ir.
Teresa, a freira que cuidava dele, e lhe pediu papel, caneta e os óculos para
escrever à sua mãe; em seguida, se deu conta de que já não podia enxergar e
pediu a ela que escrevesse o que lhe ditasse.
Ao
Pe. Minozzi dizia: “Não chores Pe. Giovanni. Em Roma, sobre o escritório estão
todas as minhas cartas. Não te preocupes que eu, do céu, te ajudarei
igualmente.
No
dia 11 o médico disse: está acabado. Seu coração ainda batia e com um suspiro,
exclamou: Vamos! Foi a última palavra que pronunciou.
O
Barnabita
Obrigado
durante muitos anos a viver fora da comunidade, quis permanecer sempre
barnabita e, dos Clérigos Regulares de São Paulo conservou o espírito e
observou a Regra em tudo quanto era possível em sua vida errante. Algumas vezes
interveio nos Capítulos Gerais da Ordem e se mostrou feliz cada vez que sua
incessante peregrinação lhe permitia viver a vida de convento.
À
vida religiosa deu sempre um altíssimo valor e reconheceu sua vocação como um
dom e uma graça da Virgem. Recordando sua profissão dizia: “Pronunciei meus
votos simples que me uniram a Deus e à minha Ordem para sempre. Nunca me
arrependi de havê-los pronunciado”.
E
nos dias difíceis de provação, a quem ousou propor-lhe outro caminho e outro
ideal, respondia com serena franqueza: “Barnabita sou e barnabita permaneço”.
Texto publicado na revista Mundo Barnabita da
Província da Espanha, ano 2018, número 13.
Autora: Anita
Tradução
e adaptação: Edvando Barros