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O Cristo Crucificado

3 de abril de 2015

O CRISTO CRUCIFICADO (I)
Certamente, a Paixão de Cristo trata-se de uma passio activa[1], porque não foi um padecimento involuntário tal como conferimos em Mc 8,31: “É necessário que o Filho de Homem padeça muito e seja rejeitado”; em suma, a Paixão tem também um caráter exterior, na qual se situa a rejeição de Jesus como blasfemo e revolucionário político: “Diante disto, o sumo sacerdote rasgou suas vestes e esbravejou: ‘Por que ainda necessitamos de outras testemunhas? Ouvistes a blasfêmia! Que vos parece?’ E todos o julgaram merecedor da pena de morte…” (Mc 14,63-64).
Por outro lado, Paulo vai dizer com severidade que Cristo sofreu do Getsemaní até o Gólgota o julgamento de Deus (cf. 2 Cor 5,21; 3,13), no entanto, o sofrimento de Jesus já começou antes da detenção pelos romanos (cf. Mt 26,36-49).
Sem dúvida, o sofrimento de Jesus compreende o abandono de Deus, que ele chama de “Abba”. Vemos em Mc 15,43: “Então, por volta das três horas da tarde, Jesus bradou em alta voz: “Elohi, Elohi! Lemá sabachtháni?”- que traduzido, quer dizer: “Meu Deus, meu Deus! Por que me abandonaste?”; por isso, com a súplica “não atendida” de Jesus começa a sua verdadeira Paixão. A experiência do silêncio de Deus é similar ao sentimento dos místicos na sua “noite obscura da alma”.
Somente na Cruz por primeira e única vez, Jesus suplica a Deus: “Eloheni”, em aramaico Elohi[2], assim, no relacionamento entre o Pai e Filho deu-se a experiência de uma morte, a morte de “Deus”, Deus abandonado por Deus, do mesmo modo pode ser interpretado que se quebra a relação comunitária; no abandono, o Filho perde a filiação e o Pai a paternidade, o amor se converte em padecimento de morte, por outro lado, note-se que no momento difícil da Cruz e na menção do Sl 22, verdadeiramente Jesus pensou em nós e não em si mesmo, com efeito, pelo seu abandono venceu nosso abandono. Em definitiva, Jesus se fez semelhante a nós, e até a morte partilhou com a condição humana.
Decerto, em Rm 1,18s Paulo utiliza a palavra “entregue” paradidonai[3], para enfatizar o fato do abandono do Pai. Claro que à luz da ressurreição muda a perspectiva, porque Deus ressuscitou-o ao mesmo que o entregou, com toda certeza, Deus assim é Pai dos abandonados. O Filho condenado se torna irmão e salvador dos condenados. Essa reminiscência é vivida na eucaristia na celebração da Ceia, isso temos em 1Cor 11,26: “Porque todas as vezes que comerdes este pão e beberdes este cálice anunciais a morte do Senhor, até que venha”.
Em conclusão, o Pai também sofre a morte do Filho, e por tudo isto, o que acontece no Calvário atinge a Trindade. Evidentemente, o Filho não é apenas objeto, mas também sujeito, de fato, Jesus era consciente da sua missão na via crucis, sem sombra de dúvidas houve uma comunhão de vontades.
Na Cruz o Pai e o Filho estão unidos, “Quem vê o Filho, vê o Pai”, por conseguinte, o Espírito Santo faz unidade entre o Pai e o Filho por amor, do qual nada nos pode separar, em suma, isso aconteceu na Cruz.
Convido para meditar o texto de Romanos 8,31-39.   

O CRISTO CRUCIFICADO (II)
Quando Deus se fez homem em Jesus não somente entra na finitude do homem, mas também pela morte entra na situação do abandono de Deus, de fato, o apóstolo Paulo bem expressa em Fl 2,6-8: “Que, sendo em forma de Deus, não teve por usurpação ser igual a Deus, mas esvaziou-se a si mesmo, tomando a forma de servo, fazendo-se semelhante aos homens; e, achado na forma de homem, humilhou-se a si mesmo, sendo obediente até à morte, e morte de cruz”. Sem dúvida, Jesus sofreu uma morte violenta como criminoso na cruz, a morte do completo abandono de Deus. No entanto, não se pode falar da morte de Deus no conceito cristão, por isso é melhor falar da morte em Deus.
O sofrimento na paixão de Jesus foi o abandono do Pai, por essa razão vemos que Deus não se torna uma religião, uma simples lei, um ideal que fica só nas nuvens, de tal maneira Deus se compromete com a humanidade, não fica alheio: “E o Verbo se fez carne, e habitou entre nós, e vimos a sua glória, como a glória do unigênito do Pai, cheio de graça e de verdade” (Jo 1,14). Isto significa que, Deus se humilhou e se encarnou e toma sobre si a morte eterna dos pecadores e esquecidos, para que todos possam experimentar seu amor, reconciliação e comunhão com ele.
No entanto, o cristão deve padecer e carregar a Cruz com esforço constante ou acompanhar a Jesus como Maria, quem estava até o último momento: “Ora Jesus, vendo ali sua mãe, e que o discípulo a quem ele amava estava presente, disse a sua mãe: Mulher, eis aí o teu filho. Depois disse ao discípulo: Eis aí tua mãe. E desde aquela hora o discípulo a recebeu em sua casa” (Jo 19,26-27).
O problema do homem moderno não é mais mito, deuses, demônio, etc., mas sim a bomba, as guerras, a destruição da natureza; de fato existe um descontrole e desequilíbrio global, a humanidade está em xeque, porque o homem pensa somente em si mesmo.
Por conseguinte, diante dos problemas do mundo, o cristão não pode ficar com os braços cruzados, é preciso ter uma abertura histórica: olhar, sentir, falar, aliviar ao modo de Jesus.
Entende-se Jesus, como modelo de amor pela humanidade, que viveu a kénosis e morreu na cruz em resgate por nós, certamente, a kénosis do Filho até a morte na cruz é máxima revelação da Trindade, é um acontecimento divino. 
Tanto católicos como evangélicos teologicamente concordam sobre o caráter soteriológico do mistério pascal, mas, surgem várias questões em nossa época: Que significou Deus para Jesus? Jesus morreu por Deus ou por nós? Em primeiro lugar, o protestantismo ligou mais a morte de Jesus com o pecado da humanidade e não desde a relação entre Pai-Filho, então, na verdade, a morte de Jesus pertence à auto manifestação de Cristo, ou seja, tem uma dimensão trinitária. Enfim, a divindade de Jesus se revela em seu rebaixamento e humanidade.
Decerto, a morte na Cruz de Jesus constitui uma parte importante para a fé cristã, porém, todo o AT vai olhar este acontecimento da morte como uma mudança na história, o nascimento da Igreja. A cruz, também significou um acontecimento escatológico, por isso, afirmamos que o mesmo Crucificado é quem ressuscita.  
Em conclusão, em nossa época é difícil afirmar que Deus sinta sofrimento, porque seus atributos de Todo-poderoso, Eteno, Imutável, representam etiquetas que nos deixam longe de uma intimidade com Ele. Porém, o novo contexto da Encarnação surge como prova e essência da compaixão divina. Jesus se fez carne, humano e terreno, que não se consume diante da grandeza da realidade divina. 
Por:







REFERENCIA BIBLIOGRÁFICA
MOLTMANN, Jurgen. El Dios crucificado. Madrid: Sígueme, 1977, p. 275-399.
MOLTAMANN, Jürgen. Trindade e Reino de Deus. Petrópolis: Vozes, 2000, p. 88-96.
BIBLIA, Edição católica.



[1] Trad.: paixão ativa.
[2] Mateus 27,46 “Por volta da hora nona, clamou Jesus em alta voz, dizendo: Eli, Eli, lamá sabactâni? O que quer dizer: Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?”.
[3] παραδίδωµι. (fut. παραδώσω; fut. pas. παραδοθήσοµαι; 1 aor. παρέδωκα; 1 aor. pas. παρεδόθην).
Entregar, traicionar, confiar, encargar, dar.
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