A.P.A
Cruz e crucifixo são temas recorrentes nas
cartas da Negri, as cartas que mais diretamente tratam esta temática são as da Sexta-Feira Santa de 1549, da Invenção da cruz de 1551 que antes era
celebrada no dia 03 de maio, e após a reforma litúrgica de 1960 deixou de ser
obrigatória para toda a Igreja, somente alguns países como México e Filipinas
ainda celebram, e da Exaltação da Cruz
de 1545. O texto, que foi traduzido pelo religioso barnabita Jaciel Maria
Baracho, apresenta trechos da carta escrita em 1545.
Uma
árvore que vivifica e cura
A árvore da cruz é ponto obrigatório de
referência da piedade cristã: Sobre a árvore da cruz fazem os seus ninhos os
pássaros contemplativos, dos quais diz o salmo que o pardal encontrou a sua
morada onde coloca os seus filhotes, isto é, os seus castos e intensos
pensamentos. Cristo está suspenso na árvore da cruz. Uma árvore para
considerar, admirar, contemplar, deleitar-se, desejando ardentemente; para
amá-lo, abraça-lo, beijá-lo, apertá-lo no coração, no centro da alma. A cruz é
aquele madeiro glorioso, tingido e ornado pelo vivo e quente sangue do Rei dos
anjos, que vivifica e cura nas presentes tribulações ... fazendo-nos alegres e
serenos, solícitos na paciência, assíduos na oração, prontos a amar quem nos
persegue, vigilantes na proteção de nós mesmos, longe da murmuração e do julgar,
unidos ao querer de Deus, tanto para nos gloriar deste madeiro glorioso, desta
árvore que nos proporciona prazer com os seus frutos e que nos rende amável
oração, fazendo-nos correr para irrigar com calorosas lágrimas e na amargura do
coração os pés de Cristo.
Um
livro rico de ensinamentos
Deleita-vos em dar algum olhar àquele
Cordeiro imaculado torturado na cruz por vós ... Familiarizai-vos por santa
consideração com os tormentos e as penas para vós aceitos. Reservai algum tempo
das outras ocupações para consumi-lo aos pés do nosso Salvador, fazei-o, de
graça, assim para tornar-vos dignos de receber a verdadeira luz e real
conhecimento da vontade de Deus em vós. De fato, Cristo se mostra a nós cheio
de cusparadas, cheio de pancadas, de desonras, de penas e de tormentos, não por
outra coisa qualquer, se não para que não façamos fundamento nas delícias do
mundo, não nas próprias comodidades e nos próprios prazeres, mas na cruz santa,
de modo que ela seja a escada que nos conduza a ele, donde ele nos espera, nos
convida, nos solicita...
Comovei-vos com esta consideração, movei-vos
a compaixão, chorai e suspirai. Este é verdadeiro pai e mais que pai, que vos
gerou e regenerou com o sangue. Ele é a vossa mãe, que vos concebeu para o
amor, dando a si mesmo pela vossa redenção, nutrindo-vos com o leite
espiritual, alimentando-vos de si com um alimento não corruptível e, em fim,
dando-se a vós por guia, provedor e pedagogo... O Crucifixo tornou-se o livro
no qual se pode aprender aquilo do qual necessitamos. Colocai-vos a lê-lo de
modo que aprendais e, aprendendo, produzais assim confiança em cada afeto de
Cristo.
Significativas,
pois dirige a um leigo, as seguintes exortações:
Penso que todas estas coisas que, como vós dizeis, vos congelam e vos assustam,
ao mais rápido vos inflamam e vos fazem arder com fogo divino, se vos
comprometeis como vos tenho dito e como melhor vos dirá Jesus Cristo no
coração. Mas, se ainda provais este gelo, porque ainda não vos aqueceis intensamente
no fogo do amor que na cruz vos foi mostrado?
Pode ser que tantas angústias e flagelos,
tanto sangue derramado, aqueles pés que penetraram cada mármore e aqueceram
todo gelo, não aqueçam, não penetrem, não confortem o vosso amável coração,
capaz de amar, de ser grato, de consumir-se, considerando quão grande é a
caridade que vos compreende? ... Animai-vos e dirigi-vos frequentemente aos pés
de Cristo crucificado: aqui vos aquecei, confortai-vos, animai-vos, vos
revigorando contra o mundo e contra tudo aquilo que procura afastar-vos do bem
iniciado. E como (deveis comportar-vos) vos será demostrado aos pés da cruz, se
aí vos agradar ficar com o desejo que vos seja ensinado aquilo que deveis
fazer.
A Lonardo Lombardi
13 de julho de 1545
NEGRI, Angelica Paula Antonia. Lettere Spirituale (1538-1551): scritte con l’aiuto dei suoi
figlioli. Introduzione di Andrea Erba e Antonio Gentili. Roma: EDIVI, 2008,
p.191-193.
Tradução: