Por: Dom Demétrio Valentini, Bispo emérito de
Jales (SP).
Quando Bento
XVI, às vésperas da quaresma, anunciou sua renúncia, tudo o que a Igreja
desejava, era ter um novo Papa para a Páscoa. E deu certo. Olhados agora os
acontecimentos, “a posteriori”, pareceria que tivessem sido agendados de
propósito, num calendário com os dias todos disponíveis. Deu não só para ter o
novo Papa na Páscoa, mas foi possível celebrar o início do seu pontificado na
festa de São José, padroeiro da Igreja, e assim liberar a Semana Santa para as
celebrações tradicionais que a ocupam por inteiro.
O pontificado do
Papa Francisco encaixou bem na dinâmica litúrgica. A esperança é que encaixe
bem no processo histórico vivido hoje pela Igreja.
As grandes celebrações litúrgicas
da Semana Santa se constituem em referência exemplar para todas as liturgias ao
longo do ano. A celebração da Páscoa, de certa maneira, “formata” todas as
outras celebrações do Ano Litúrgico.
O início do pontificado do Papa
Francisco teve a feliz coincidência de acontecer na reta final da quaresma,
onde as celebrações litúrgicas propiciam um simbolismo fecundo, apontando valores
muito importantes, que servem de referência para todo um programa de governo
eclesial.
De certa maneira, dá para dizer
que o Papa Francisco, nesses seus primeiros dias de Bispo de Roma, escolheu as
referências que traçam a linha do seu pontificado. Usou gestos e palavras, que
servem de parâmetro, para “formatar” esta linha.
Ele emitiu sua mensagem cifrada.
Tentemos decifrá-la, para entender bem seu recado. Sua jogada estratégica
começou pela escolha do nome. Foi sua primeira decisão, depois de ter aceito
sua eleição. Isto mostra que desde o seu primeiro momento como novo Bispo de
Roma, foi logo traçando um rumo para a missão que acabava de abraçar.
Tendo São Francisco como
referência, e como escudo para neutralizar possíveis resistências, foi
colecionando gestos e palavras que foram cimentando as primeiras impressões
positivas, a respeito de sua pessoa e de suas intenções.
Para sinalizar sua vontade de
encontrar grandes consensos com a humanidade de hoje, elegeu a ecologia, como
terreno fácil e evidente de coincidências entre as causas da Igreja e as causas
da sociedade. Insinuando assim que está disposto a buscar outras convergências,
que reaproximem a Igreja das grandes questões que afligem hoje a humanidade,
mergulhada em crise profunda, nestes tempos de tantas mudanças.
Para sair da defensiva, diante de
acusações que lhe sacam, a Igreja precisa, decididamente, colocar-se a serviço
da vida. Com esta postura radical conseguirá sair do sufoco a que foi submetida
por problemas internos, que serão superados na medida em que abraçar as grandes
causas da humanidade.
Nesta perspectiva, tomam sentido
os gestos de simplicidade, de despojamentos, e de bondade, que o Papa Francisco
veio fazendo nestes dias, numa evidente intenção de seguir o roteiro vivido
pelo Papa João XXIII.
Nesta semelhança com o “papa da
bondade”, se entende, por exemplo, sua decisão de celebrar a missa do
“lava-pés”, no Instituto Penal para menores Casal Del Marmo. Entre as atitudes
que mais popularizaram João XXIII, foi exatamente sua visita aos detentos no
presídio de Roma.
Mas João XXIII teve a grande
oportunidade de convocar um Concílio, para o qual canalizou as simpatias
pessoais que ele tinha angariado, convocando a todos para o grande mutirão em
que se constituiu o Concílio.
Qual será o novo mutirão que o
Papa Francisco vai desencadear, para justificar as grandes esperanças que ele
despertou com sua insistente convocação nestes dias de Semana Santa?
Depois da Páscoa, a Igreja leva
sua fé para o cotidiano da vida. Depois dos gestos e das palavras animadoras, o
Papa Francisco precisa tomar suas primeiras iniciativas práticas.
Como pediu nossas orações, não
lhe faltará nosso apoio para implementar suas decisões.
Fonte: cnbb.org.br